sexta-feira, 30 de novembro de 2007

A tragédia de globos e mapas

Começavam os anos 80. Vinham os yuppies com seus talquinhos.

Zoroastro era da classe média alta, tinha uma fábrica de globos e mapas.

Lembra? Lembra daquele globo em cima da escrivaninha?

- Poizé, mano, o Zoroastro fabricava aquele baguio.

Então veio os anos 80. E com eles a depressão econômica que marcou aquela época.

Empresa de família de português misturado com espanhol, globos bonitos, mapas plastificados, duram toda a vida, mas não uma empresa de globos e mapas.

Um dia foram os homi mais o oficial de justiça lacrar a empresa. Num tinha mais empregado lá. Nem campainha atendia.

Entraram na marra. Encontraram o Zoroastro na sala do chefe, com os zóio arregalado, dois globo...uma fedentina.

terça-feira, 27 de novembro de 2007

Pérola do Orkut

Para quem gosta de garimpar pérolas de linguagem, o Orkut é um prato cheio. Mas algumas delas se repetem à exaustão, como se sua fórmula fosse capaz de expressar uma sintonia do sujeito orkutiano com o que há de mais contemporâneo no mundo hipercapitalisma.

É expressiva a quantidade de possoas que escolhem a opcão "depende" no item POLÍTICA do perfil. Uma perguntinha simples do véio: "depende de quê?" ou para imitar a moderna linguagem midiática: "depende de quê, cara pálida?".

Ao dizer "depende", o sujeito orkutiano estabelece uma relação de dependência da sua opinião com alguma outra coisa. Cabe ao véio perguntar: "depende do benefício que se possa ter?"

"depende de quem ganha e quem perde?"

O véio está desconfiado que o tal "depende" pode ser uma tentativa, frustrada, diga-se de passagem, de associar a imagem do sujeito orkutiano ao mito do ser autônomo no hipercapitalismo, o tal do self made man em versão digital. "`Depende` porque eu sou 'indenpendente'", diria o sujeito orkutiano, para quem calça diesel é um provável símbolo de independência.

Pois bem, parece que essa visão política que se afirma ao se negar - "depende porque sou indenpendente" - é uma tentantiva um tanto quanto frustrada de dizer que a ideologia acabou.

"Depende" é muito mais ideológico do que qualquer outro rótulo que se ecolha. Aliás, para o Orkut, POLÍTICA é apenas uma lista drop-down, mas isso é um outro papo...

segunda-feira, 26 de novembro de 2007

Sujeito barrado do ciberespaço

É a cena principal do Paris, Texas, de Win Wenders. O sujeito é barrado por uma tela de vidro na interação com a prostituta. A visão tem um só sentido. Ele enxerga a mulher, mas esta não. A voz só vem pelo interfone, ou seja, a voz é obliterada para alcançar seu alvo.

O que Wenders fez parece que foi prever o que acontece com a gente no ciberespaço. O sujeito virtual é alguém, um ser, um existente que:

Não tem olfato
Tem uma visão bidimensional
Não tem tato
Tem audição mediada
Não tem paladar

O ser do ciberespaço tem dois sentidos parciais – ele ouve pela caixa de som e vê pela tela do computador.

Talvez esse seja o principal desafio da tecnologia: dotar o sujeito virtual de sentidos. Quando não há sentidos, o equívoco na comunicação se potencializa, se espraia. Alguém já disse que a comunicação não existe. Cada um entende uma coisa. E ninguém entende a mesma coisa.

Sem os sentidos, o ciberespaço é uma névoa de semblantes, o imaginário transborda e convoca a morte.

O ciberespaço é a morte do simbólico na cultura humana.

domingo, 25 de novembro de 2007

Nem mais nem menos

Em 1969 o homem foi à Lua, há quem conteste. Mas em 2007 inda tá faltando água no Ceará.

E a tiinha pra repórter da tv:

- Pra lavar a cabeça é um litro dágua, uma vez por semana, nem mais nem menos.

Dos que despertam...

com mundos livres e a pequena pressa
é este o início
quase podre, quase fraco, é este o inicio
solidão, amor, vida... não sabemos quem é quem
até que um dia algo brilha, esta é a vida
até que um dia algo vibra
este é o amor
até que um dia algo exige, esta é a solidão
novos amores sem carne mas com coração
o que é isso?...mil perguntas e uma resposta
porque tantas conclusões?...

Saulo Lance

sexta-feira, 23 de novembro de 2007

Abdução

O Véio tava caminhando uma trilha e encontrou uma alma doutro mundo. Achou que era uma extra-terrestre que estava ali, disfarçada de Afrodite, à espreita para abduzi-lo. Aí o Véio pensou: “e por que não?!”. Foi assim, envolvido numa nuvem inebriante, que o véio pôde então conhecer outros planetas e tomar contato com outras formas de existência, pôde saber que tem lugar nesse universo infinito que as gentes têm os pés onde nós a cabeça e a cabeça onde nós os pés.

quarta-feira, 21 de novembro de 2007

Algumas palavras femininas

violência

crueldade

exuberância

por que a ação está no feminino?

terça-feira, 20 de novembro de 2007

A coisificação do universo

A mãe cozinha, o menino brinca.

O pai lia jornal, mas agora fala pro menino:

- Filho, vamu cumigo na padaria?!

- Ah, paiêêê....

- Vamo, eu te dô uma coisa...

Comunicado da Administração

Caro moradore,
No próximo sábado, dia de Santo Antão, teremos a visita do senhor prefeito, que vem à nossa rua para inaugurar a iluminação pública. Não se sabe ao certo a que horas vem o senhor prefeito, mas o que se sabe é que vem, e isto já basta para que tomemos uma série de atitudes em função do espetáculo que se espera ter. Algumas senhoras estão a perguntar também quanto ao tipo de costume, de vestimenta, que deverá ser usado. Pois, por meio deste escrito, estamos a esclarecer que vale todo o tipo de vestimenta, desde que as partes pudorentas estejam devidamente acobertadas, recomenda-se especial atenção àquelas raparigas com ancas mais generosas que atentem para o fato de que com a iluminação pública a rua ficará com mais claridade, e como a luz vem de cima, afinal está no alto do poste, é bom que os decotes sejam mais moderados e até mesmo que se evite certos tipos de camisas que podem ser usadas sem sutiã. Aproveitamos para informar aos amigos mais próximos da diretoria que teremos uma garrafa de bagaceira atrás do palco.

A Administração

terça-feira, 13 de novembro de 2007

Jornalismo na Fuvest

Dentre os cinco cursos preferidos da Fuvest deste ano - jornalismo, publicidade, relações internacionais e medicina-, três têm a ver com mídia, um com globalização e um, a medicina, com tradição. Esse é um cenário bem diferente daquele dos anos 70, 80, quando a medicina era au concour, quando a medicina era capaz de elevar seus alunos à condição de deuses no Olimpo. Os tempos mudaram e o imaginário se deslocou para um outro lugar. O poder hoje está em ser jornalista, publicitário, está em participar do jogo da mídia, está em celebrar a democracia - esse é pelo menos o discurso que esconde o desejo mórbido de se projetar como ego.

Nesse desejo, destaca-se o jornalismo mas podia ser qualquer outra coisa, desde que estivesse identificada com o poder. As profissões da mídia emergem como um falo no imaginário dos estudantes, que se vêem ocupando o espaço da tela da TV. Mas há um preço a ser pago para ocupar esse espaço, e certamente o candidato ao jornalismo não têm noção disso. O preço é o preço de jogar de forma correta, de encobrir a realidade com o discurso estúpido da indignação, que tanto apraz certos veículos. O preço é também o de reforçar o discurso em favor do consumo, numa sociedade que transforma tudo em produto.

Ser jornalista sim, ser crítico não. Esse é um sintoma da cultura: a profissão brilha em um tempo em que o discurso é homogêneo, pois parece mesmo que o conteúdo não é importante - todo ele se resume na apropriação do público pelo privado para os interesses do consumo. Mas também por que se perguntar pelo conteúdo se a imagem na tela expressa muito mais para a rede de egos que filtra a notícia?

segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Amor e filosofia

Talvez o senso-comum tenha dificuldade em admitir que o amor seja especulável. Certamente, isso acontece porque o amor é um lugar de certeza, onde reina o absoluto. Quem ama, sabe que ama e isso é indiscutível.

Se observarmos o discurso de cada um de nós não sobre o amor, mas sobre o ser amado teremos uma evidência de que o amor - aquilo que dá suporte ao ideal do ser amado ou ao ser ideal - é algo que tem um significado subjetivo, é algo que se particulariza, que se concentra no que é único, imutável, no que é a razão de ser da existência.

Mas se do ponto de vista da linguagem tudo cabe na palavra “amor”, ou lembrando Gilberto Gil, “na lata do poeta tudo nada cabe” – então parece que o amor é a maior expressão do ser humano na cultura, pois é pura metáfora. É á única palavra em que a coisa referente pode ser qualquer coisa, em que o significado se desloca o tempo todo ao longo da vida, pois subjetivamente estamos sempre a procurar uma definição para a possibilidade de encobrir a angústia da solidão. O amor é algo que pode se definir até mesmo pela sua inexistência.

sábado, 10 de novembro de 2007

violência - cinema e realidade

O sucesso do filme Tropa de Elite demarca tristes tempos para o cinema brasileiro. Finalmente, o cinema entra na lógica do capitalismo e industrializa a realidade. O diretor José Padilha nega, mas o filme é leite derramado - defende a violência como instrumento de combate ao crime. Insere o espectador na posição de torcedor do capitão Nascimento e assim nos afasta mais um pouco do real debate sobre a violência.